Sobre a Rede Ubuntu

Ao se despedir das crianças da etnia Zulu, em sua passagem pela África do Sul, o educador Alexandre do Nascimento organizou uma corrida, a fim de dar uma bola de futebol como lembrança ao primeiro colocado. A largada foi dada, mas as crianças correram de mãos dadas e cruzaram a linha de chegada juntas. Ao questionar sobre o porquê daquilo, ele ouviu: “É Ubuntu, senhor, somos cada uma e cada um de nós, porque nos fazemos  e fazemos tudo juntos”.

É nesse conceito que nos baseamos em nossa prática. Ubuntu é uma filosofia universal que possui princípios ligados à coletividade, solidariedade e comunhão. O ponto principal dessa filosofia se dá na compreensão de que cada indivíduo só o é por meio do outro, já que suas existências estão diretamente conectadas.

A palavra “ubuntu” tem origem nas línguas bantu e não possui uma tradução literal. Apesar disso, pode expressar algo como “eu sou porque nós somos”. Essa máxima exprime a noção de fraternidade e empatia, numa valorização do coletivo em oposição ao individualismo.

O trabalho que realizamos precisa estar ligado à essa filosofia, uma vez que nas periferias essa prática da coletividade está vinculada fortemente ao povo. Historicamente, foram negados às periferias, aos pobres, aos negros e às mulheres diversos direitos, como a educação. Para conquistá-los, é importante também resgatar filosofias que não estão apenas no imaginário periférico, mas em sua ancestralidade, já que a nossa filosofia é africana.

A educação que a Rede Ubuntu se propõe a fazer é inspirada em Paulo Freire, patrono da educação brasileira. Isso significa que defendemos uma educação popular, que esteja vinculada com a realidade dos educandos e educadores e que também seja reflexiva, e não somente conteudista.

Uma educação reflexiva e popular se dá a partir da construção do conhecimento de forma coletiva entre alunos, professores, coordenadores e parceiros. Essa união, em harmonia, é capaz de trazer reflexões importantes sobre o papel de cada um dentro da sociedade.

Dessa forma, em nossos encontros, defendemos valores que se ligam diretamente às nossas ações, dentro e fora do cursinho. A valorização e o conhecimento sobre o território que vivemos, por exemplo, é uma forma de refletir sobre nossa realidade, pois se trata de algo próximo e inevitavelmente ligado a cada membro da Ubuntu. É também por isso que homenageamos pessoas da nossa quebrada como patronos e patronas de nossos polos.

Além disso, procuramos estabelecer sempre uma relação amigável entre educandos e educadores, pois o afeto e a acolhida são importantes no processo de aprendizagem. Esses pontos vão contra a hierarquização do conhecimento e deixam os educandos menos pressionados num ano tão importante como o de vestibular. 

Por entendermos que a educação é uma ferramenta fundamental de transformação social, é de suma importância que ela seja de qualidade e acessível. Por isso, defendemos a popularização do Ensino Superior, sobretudo público, por se tratar de um direito social que, não estando em vigor, mantém desigualdades estruturais.

Sabemos que as dificuldades no acesso às universidades são sempre maiores para os pobres, pretos e periféricos. Estimular o interesse desse público requer, entre outras coisas, elevar a sua própria autoestima, mesmo diante de tantos problemas sociais. É por isso que defendemos uma educação que seja inclusiva, antirracista, feminista e que conte a nossa história. Defendemos, em suma, uma educação calcada nos Direitos Humanos.